27/03/2016 by marioregueira

Racimos e maçãs

Los ritos de los sentidos

Soy el damasceno y sim abrieran mi cuerpo / brotarían de dentro racimos y manzanas. (Sou o damasceno e se abrissem o meu corpo / brotariam de dentro racimos e maçãs.) Poucos versos poderiam definir melhor o espírito de Los ritos de los sentidos que estes do poeta sírio Nizar Qabbani, um dos grandes nomes da poesia árabe e que não poderia faltar em nenhuma das suas antologias. O volume que nos oferece a equipa formada por Jaouad Elouafi, Bahi Takkouche, Manuela Palacios e Arturo Casas caracteriza-se por não fugir de elementos que em ocasiões poderiam ser tomados como lugares comuns com un certo ressaibo orientalista. A cultura árabe como um transbordamento da sensualidade, como uma fonte de evocação cheia de aromas a fruta e especiarias e onde as paixões correm descontroladas, é apresentada em muitos dos poemas do livro sem maiores complexos. Sem dúvida o intuito editorial acompanha esta perspectiva, e por isso Los ritos de los sentidos é um volume de grande tamanho, retangular e enormemente vistoso que conta ademais com a arte caligráfica de Hachemi Mokrane como um elemento que compete em protagonismo com as próprias transcrições convencionais dos versos e as suas letras de forma latinas ou árabes.

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E porém, como não poderia ser de outo modo num trabalho que conta com a participação de pessoas como Manuela Palacios e Arturo Casas, a perspectiva é bem mais ampla e os próprios sentidos, com a sua sensualidade adjacente, encontram também motivos para o discurso diverso e as possibilidades subversivas. Assim, surpreende o marco temporário amplo, no que a poesia sufista dentre os séculos VIII e XIII convive com poetas do século XX e da actualidade. Também o facto de que na primeira se inclua uma mulher, Rábi’a Al-Adawiya, não por acaso uma figura que serve de ponte entre a filosofia mística e os primeiros questionamentos sobre o rol da mulher na sociedade. Se calhar Al-Adawiya seja a primeira de uma corrente de poesia feminina continuada por outras autoras contemporâneas presentes no livro, como a saudita Fawziya Abu-Jálid, capaz de selar a paz nos seus versos entre as serpes edénicas e as mulheres. Ao lado desta perspectiva, Los ritos de los sentidos recolhe também o seu próprio inventário do exílio. Os conflitos nacionais e a dor da separação vibram na simples menção de nomes como o do palestiniano Mahmud Darwish, mas também nos versos do curdo Buland Al-Haidari ou do iraquiano Ahmad Matar. Diversidades que também são geográficas e marcam o continuum cultural entre as terras mais afastadas do Oriente e o próximo Magreb.

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Um volume que responde à evocação e ao estímulo visual que muitas pessoas procurarão nas suas páginas, mas que também tem a grande virtude de conter tanta diversidade e miradas alternativas como para fazer rebentar as suas costuras. Sem dúvida delas brotarão racimos e maçãs, também paixões que rebelam as entranhas das amantes contra sim próprias e o constante amor à identidade que, como canta Qabbani pode resumir-se na sua singeleza: Aqui están mis raíces, aqui mi corazón, aqui mi lengua / ¿debo hablar más claro? ¿acaso necesita el amor explicación? (Aqui estão minhas raízes, aqui meu coração, aqui minha língua / devo falar mais claro? e que precisa o amor explicação?)

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